"Orquestra com instrumentos construídos no lixão recupera sonhos de crianças paraguaias"

"Orquestra com instrumentos construídos no lixão recupera sonhos de crianças paraguaias"

"Orquestra com instrumentos construídos no lixão recupera sonhos de crianças paraguaias"

Conheça a Orquestra de Reciclados de Cateura e a batuta mágica de um maestro fazedor de sonhos.


Um lugar de lixo, pestilência e mau cheiro. 

Quem mora no centro de Assunção jamais iria ao bairro de Cateura. 

O que pode ser mais inusitado do que “Garota de Ipanema” sair justamente daqui?
"É um som que me acalma. 

Se vou pra cama, durmo que só!", conta a vendedora ambulante Victoria Ortiz.


"Eu e minha família choramos de emoção. Os vizinhos correm à rua para ouvir", diz a catadora de lixo Mirian Cardozo.

“New York, New York” emana dos detritos de Cateura. E pelos caminhos do lixo, jovens aparecem empunhando estranhos instrumentos musicais.

"As pessoas não sabem o que levo nas costas", diz Brandon Aranda, de 16 anos.

Brandon toca Beethoven no que parece ser um contrabaixo.

Fantástico: Você já conhecia música clássica?

Brandon: Não.


Fantástico: Beethoven, Mozart?


Brandon: Não, não conhecia.


A nota grave sai de dentro de um tonel de óleo. 
"As pessoas pensam que barril velho não serve para nada. Mas para nós, serve."

O responsável por tirar música de sucata é Fávio Chavez. Ele é técnico ambiental de uma fundação e foi trabalhar em Cateura, onde fica o lixão da capital do Paraguai.

Cinco mil famílias sobrevivem catando lixo num imenso aterro.

"A metade das 25 mil pessoas que vivem em Cateura são crianças", diz Fávio. 

“Crianças de 11 ou 12 anos que aprendem a ser pais e mães de seus irmãos menores”.

Como também é músico amador, Fávio resolveu ensinar o que sabe a quem quisesse aprender. 

Mas com que instrumentos, se um bom violino custa US$ 300?

"Todo violino tem uma parte da frente e uma parte de trás. 

No meu violino, a parte da frente é uma lata de tinta. 

E a parte de trás é uma assadeira de pão", mostra Ada, de 14 anos. 
“O rastilho de prender as cordas é um garfo".

Ada, uma das melhores alunas de Fávio, toca Vivaldi com as amigas em violinos de lata.

"Quando Fávio me mostrou esse violino, achei genial! Era muito colorido".

A Noelia é irmã da Ada. 

Ela tem 13 anos e, de tanto ouvir a irmã mais velha tocar, quis aprender um instrumento também. 

Ela escolheu o violoncelo. 

No dela, a caixa de ressonância é feita de uma lata de azeite. 

Todo o sistema de sustentação das cordas foi encontrado no lixo: uma escova de cabelo, duas colheres de pau e um martelo de bater bife. 

Daqui pode sair o mais puro Mozart.

"Como faltavam instrumentos, houve necessidade de improvisar e fabricar instrumentos alternativos com o material que tínhamos a mão", explica o maestro.

Fávio montou uma pequena oficina nos fundos da casa dele. 

Nicolás Gomez, catador de lixo em Cateura, e carpinteiro de mão cheia, se ofereceu pra ajudar. 

"Quem imaginaria que sai música do lixo? É fenomenal!"

É ele próprio quem escolhe, no lixão, o material que vai usar. 

"Olho para o entulho e já vejo um violoncelo numa lata de tinta".

Um violino fica pronto em um dia. 

Um sax soprano é mais complicado. 

Leva dois dias para ajustar botões, moedas e tampas de garrafa nas chaves das notas de sopro.

Fávio mostra o seu próprio instrumento. 

É um violão como outro qualquer. 

Só que a caixa de ressonância são duas latas de doce. 

Uma de baunilha e outra de chocolate.

Mas dá pra dizer que é um som perfeito? 

"O som está marcado pelo material que o produz. 

Se ele é feito de lata, produz um som ‘latoso’. 

Mas tem a mesma afinação de um violão".

E som ‘latoso’ dá música clássica? 

"Claro! Um Beethoven ‘latoso’”, responde Fávio.

O coral da Nona Sinfonia em som de lata. 

"O que nós fazemos é transformar a curiosidade de toda criança num interesse pela música. 

Mostramos que a música não é algo que esteja longe deles".

O interesse foi tamanho, que Fávio teve de montar uma orquestra. 

Assim nasceu a Orquestra de Reciclados de Cateura.

Maria Cardozo, 16 anos, é uma das 30 componentes. "A música é minha vida", ela diz. 

"Se você tira música do lixo, você sabe que tudo é possível. 

Podemos realizar nossos sonhos, seguir adiante".

E o sonho impossível da comunidade inteira aos poucos foi se transformando em convites reais para viajar. 

"Até para Buenos Aires a minha filha já foi".

"Ninguém acreditou quando eles foram se apresentar em Amsterdã".

Foram dezenas de concertos mundo afora. 

Inclusive no Rio de Janeiro, como nesta apresentação em que Fávio fez um arranjo da primavera de Vivaldi.

Se Fávio considera essa uma apresentação perfeita? "Depende do que você chama de perfeição", diz. 

"Uma orquestra pode ser perfeita como expressão musical. 

Mas, para nós, importa que seja perfeita socialmente falando. 

Com a música a criança aprende outras expressões de sensibilidade. 

Porque, estando numa orquestra, aprendem a ser solidários, responsáveis, respeitosos".

O que não significa que Fávio não tenha descoberto talentos de exceção. 

 Como Natália Aranda. 

“Quando toco um instrumento, é algo muito meu. 

Sinto que faz parte da minha vida", diz a menina. 

"Eu quero ser uma grande violinista, e nossa orquestra prova que nada é impossível".

Para Fávio a determinação de Natália não é exceção. 

E mostra uma mudança geral de comportamento. 

“Imagine uma criança que não conseguia se concentrar cinco minutos, e agora integra uma orquestra e tem a vida planejada com um ano de antecedência."

Se for preciso, o maestro põe dinheiro do próprio bolso para comprar o material de sua oficina. 

O que ele ganha fazendo o que faz? 

“O privilégio de mudar vidas. 

Às vezes, me sinto empunhando uma varinha mágica que realiza sonhos."

Senhoras e senhores,  com vocês a Orquestra de Reciclados de Cateura, e a batuta mágica de um maestro fazedor de sonhos.
mensagensdiversificadas.

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